sexta-feira, 25 de novembro de 2016

'Fominha', Renato conta como chegou aos 37 jogando: sem hambúrguer por anos


Renato é o único jogador do Santos que atuou todos os jogos do Campeonato Brasileiro. Em entrevista exclusiva ao UOL Esporte, o camisa 8 revelou alguns de seus segredos para chegar aos 37 anos jogando em alto nível. O principal deles se resume a alimentação. O experiente volante não come hambúrguer e batata frita há 14 anos e não bebe refrigerante desde 2012.

Além disso, Renato conta o problema que enfrentou com um de seus fakes no Facebook. O "falso Renato" postou uma foto com uma sunga do Botafogo nas últimas férias e arrumou problema para o volante com a torcida santista.

Renato também falou sobre a relação com ex-companheiros de time e amigos – casos de Robinho, no Santos, e Luis Fabiano, no Sevilla. O volante disse que o "rei das pedaladas" tinha potencial para chegar mais longe na carreira e lembrou os conselhos para acalmar Luis Fabiano. 

Confira a entrevista completa com Renato:
UOL Esporte: Qual o segredo para jogar esse futebol de hoje sem sofrer lesões?
Renato: Acho que é a preparação física, principalmente na pré-temporada. O começo do ano é a base para suportarmos toda a maratona de jogos. As viagens são longas no Brasileiro, geram um desgaste grande. Tem também o fato do Dorival me poupar em algumas viagens da Copa do Brasil, principalmente nas primeiras fases quando jogamos no Acre, em Roraima, o que é bem desgastante. Me alimento bem, durmo bem e faço uma prevenção antes dos treinamentos, voltado para a parte de força. Faço o core [training], abdominal e tenho uma prevenção voltada para o meu joelho esquerdo, onde fiz uma cirurgia. Essa prevenção tem ajudado e dado todo um alicerce para jogar todas essas partidas.

UOL Esporte: Essa prevenção requer mais tempo? Você chega bem antes aos treinamentos ou sai depois dos demais? Como concilia?
Renato: Eu chego antes do treinamento, acontece antes da atividade física. Depois faço banheira de gelo ou uma massagem. A prevenção sempre acontece antes para poder fazer e estar apto, sem ter nenhum tipo de lesão.

UOL Esporte: E com relação a alimentação? O Neymar, por exemplo, adorava comer no McDonalds. Você precisa se privar disso?
Renato: Já me privei há muito tempo. Desde 2002 que não como no McDonalds, só uma batata frita, ou outra, mas não como. É algo que tirei da dieta, não como e não sinto falta. O refrigerante fiz uma promessa para o meu filho, em 2012, mas acabei tirando em definitivo. Já são quatro anos sem tomar nada, também não sinto falta. Acabou me ajudando, me sinto melhor. Não sacia a sede, não é por aí. No dia a dia procuro me alimentar bem, fazer as quatro refeições: café da manhã, almoço, se tiver um tempo livre em casa procuro comer algo durante a tarde e depois o jantar. Até o lanche à noite faço, também, porque sei que o organismo não pode ter muito tempo entre as refeições. Como doce, também, mas claro que sem exageros. Tirando o lanche que estou há 14 anos, como um pouco de tudo.

UOL Esporte: Faz muita diferença a questão dos lanches? Por que essa questão exatamente? Alguém chegou a te influenciar para isso?
Renato: O lanche tirei porque não via essa necessidade. Estava com 23 anos na época e era solteiro, namorava na época, mas comecei a ver que não sentia falta ou vontade. Sei que os meninos comem, pedem, ligam. Na madrugada procuro comer uma comida ou fazer outra refeição. Não teve ninguém específico, ouvia para evitar de comer os lanches, os [jogadores] mais velhos falavam. Na televisão ouvíamos a questão de obesidade, também, mas não teve alguém a me falar.

UOL Esporte: E hoje você faz esse papel de instruir os mais jovens ou você sofre um bullyng por ser uma decisão careta?
Renato: Eu comento e falo, como mais velho dou esse conselho para quem está começando. Nas minhas refeições alguns olham, vêem muita salada, e comentam: 'queria comer como você, mas não consigo'. Digo que é questão de hábito, precisa praticar. Sempre que estou ali faço a refeição com salada, procuro mostrar para eles que futuramente vão precisar. Se já tiverem esse hábito de começo, só vai ajudar na performance deles. O metabolismo do jovem é diferente do nosso, que já passou dos 30, mas ajustando assim vai ser muito melhor.

UOL Esporte: Você chegou a ver alguém que poderia ter ido mais além ou se prejudicou por essa questão alimentar?
Renato: Tinha um menino no Guarani que subiu junto comigo ao profissional, chamado Fernandinho. Hoje é treinador do sub-11, ele tinha tendência a engordar. Não sei o motivo para ter parado, tinha um potencial enorme. Do grupo, fomos os que subiram primeiro aos profissionais. Encontrei com ele recentemente, vi que está mais cheinho. Disse que estava comendo muito, foi uma pena ver ele assim. Alguns falam do Walter, também, ,mas não sei qual o processo dele. Já vi falarem que o Walter é assim, que se fizer uma dieta muito rígida vai perder a massa e a explosão. Acho que é o biotipo de cada um, isso varia muito. Se colocar ele com 80kg, sendo que pesa 90kg, não vai conseguir jogar. Não vai ter a força, talvez.

UOL Esporte: Você está com 37 anos. Qual a sua meta?
Renato: Estou indo ano a ano. Brinco sempre com o Zé [Roberto, do Palmeiras], pergunto se vai parar, mas não para. Não sei se vou chegar nele, mas a minha projeção é que se no ano estiver bem, com prazer de jogar, de vir treinar, de disputar títulos, vou continuar, mas sempre me respeitando. No momento em que estiver atrapalhando, a minha cabeça quiser, mas as pernas não ajudarem, aí preciso pensar. Tenho contrato até dezembro do ano que vem, espero cumprir. E me sentindo melhor, tenho já uma prorrogação para 2018, é o que tenho em mente. Estarei com 39, a partir disso converso com a minha família, sempre falo com eles para fazer uma mudança. Espero que seja o meu último clube, sou santista de coração.

UOL Esporte: Você sempre foi um jogador centrado. É difícil vê-lo se expondo ou entrando em confusão. Assusta ver uma geração de atletas cheios de tatuagens, brincos e polêmicas? 
Renato: O que notei e que mais me surpreendeu foram as redes sociais. Antigamente não tínhamos como hoje, do torcedor ter acesso a tudo o que postamos. Está tudo mais próximo e isso acaba às vezes provocando discussões. O cara pode estar de cabeça quente, aí sai uma matéria de que fulano discutiu com um torcedor. As brincadeiras sempre existiram, essa coisa de rixa em clássicos. Hoje em dia não podemos brincar muito, pois pode incitar a violência. É uma brincadeira nossa, mas que foi para outro lado. Hoje se criou algo de que não pode a brincadeira entre os atletas. Isso é algo a parte, o que não pode é faltar o respeito com a entidade. Existe as nossas brincadeiras, provocamos o Robinho, mas não é nada com o Atlético-MG, é com o Robinho. Acabam confundindo. Tenho Twitter e uma página no Facebook que não utilizo. Existem as fakes, acham que sou eu que estou colocando.

UOL Esporte: Tem alguma história maluca com isso?
Renato: Aconteceu esse ano, ou no ano passado. Em janeiro, estávamos voltando de férias, o cara postou uma foto minha com a sunga do Botafogo. As pessoas criticaram, aí expliquei que não tinha página no Facebook. Estava com mais de 13 mil curtidas, achando que era comigo. Até lembro onde foi aquela foto e colocaram como se tivesse usado nas férias. Hoje em dia acaba prejudicando não só na gente, mas até o torcedor que é enganado.

UOL Esporte: Com relação aos clubes, o Santos você coloca em primeiro na sua vida? No Botafogo ficaram com uma impressão muito boa de você.
Renato: O Santos é o meu clube de coração. Sou santista por influência do meu pai, desde pequeno, mas tenho também um carinho muito grande pelo Guarani. Foi o clube que me formou, onde cheguei aos 14 anos. Fiz a minha base de treinamentos, batida na bola, domínio. Tenho um carinho enorme, torço muito. Tem o Sevilla, que me abriu as portas da Europa. O Botafogo foi para onde acabei voltando, que me fez uma proposta concreta. Depois, mais feliz ainda de voltar ao Santos.

UOL Esporte: Após encerrar a carreira, mesmo depois dos 40, o que você pensa? Virar técnico, empresário, dirigente...
Renato: Como treinador não quero. Busco evitar as viagens e as concentrações que são desgastantes não só para mim, mas como para a minha família, também. Tenho dois filhos pequenos que me cobram em casa. Gostaria de trabalhar no Santos, ser um auxiliar fixo, trabalhar nos bastidores. Ajudar até pela gratidão ao clube que me abriu as portas da Europa e da seleção brasileira.

UOL Esporte: Então a comissão técnica é um caminho? Dizem que você costuma jogar de terno, mas colocar o terno, como dirigente, está descartado?
Renato: É complicado, uma coisa a ser pensada. A minha preocupação são as viagens. Uma hora, ou outra, até posso ir, mas não quero a rotina que levamos como jogadores.

UOL Esporte: E essa história de jogar de terno que a torcida tanto fala? De onde surgiu isso? O que acha?
Renato: Acho que é pela minha maneira de jogar, pela minha postura quando corro. Sempre foi assim, desde a base no Guarani tenho esse perfil. Faço o mais simples possível dentro de campo, uma coisa, ou outra, foge: um drible, um chapéu, mas é o momento. Nunca dei para menosprezar ninguém, é um momento oportuno. Cheguei a fazer isso dentro da área, que fiz pelo instinto. É pelo recurso que temos. 

UOL Esporte: Você ficou um ano inteiro sem tomar cartões. Isso para um volante acontece de que forma?
Renato: Procuro sempre ir na bola. O pessoal as vezes fala que eu não fazia faltas. Eu fazia faltas, até fiz uma na final, em 2002. Só que eram diferentes, não sou de dar carrinho, que leva o jogador aos cartões. Outra coisa é que evito reclamações com os árbitros. Procuro conversar, questionar sem gesticular porque sei que arbitragem fica brava, logo dá um cartão amarelo. Se reclamo, faço isso olhando para o lado, nunca direcionado a eles.

UOL Esporte: O Léo falou que o jogo da vida dele não foi o de 2002, mas um confronto com o Vélez Sarsfield, pela Libertadores-2012. E o seu?
Renato: O meu é de 2002, os dois jogos da final são insuperáveis. Aquele título para a nossa geração coroou o nosso trabalho, ninguém acreditava. Não sei se foi o maior jogo, mas foi o mais feliz. Tínhamos uma alegria fora de campo que levávamos para dentro, uma coisa única. Fora tinham as brincadeiras e dentro isso acabou ajudando.

UOL Esporte: E quem foi o melhor companheiro que jogou a favor?
Renato: O Robinho. Ele demonstrou muita personalidade. O Diego era muito inteligente, era o cara do passe, mas o Robinho tinha o improviso. Ele cresceu muito depois de 2002, ninguém achava que ele iria chegar e chegava. Era um jogador que fazia nos jogos o que realizava nos treinos.

UOL Esporte: Muitos falam que ele poderia ter sido ainda mais do que foi na carreira, você concorda?
Renato: Eu acho que sim, se tivesse mais paciência no Real Madrid, claro que não sabemos o dia a dia dele lá, o jogador precisa estar feliz no clube, poderia ter sido ainda mais do que foi. Ele chegou lá arrebentando, depois trocou pelo Manchester City que ainda não era aquela potência.

UOL Esporte: E qual o jogador mais difícil que marcou?
Renato: O Zidane, peguei ele jogando pelo Real Madrid. Era inteligente demais. Apesar de ter jogado com Ronaldo e Rivaldo na seleção, contra o Ronaldinho Gaúcho, cito ele.

UOL Esporte: Você também é idolatrado em Sevilha. Tem alguma história que te marcou muito?
Renato: Tem uma contra o Bétis, o maior rival. Até hoje me mandam mensagem pelo Twitter. Foi em um dérbi que era a estréia do Rafael Sóbis e fiz um gol aos 40 minutos do segundo tempo. Estava 2 a 2, marquei o 3 a 2. Aquele gol marcou pela torcida. Claro que tem os títulos, mas aquele ninguém esquece. Ficou marcado para mim, também.

UOL Esporte: E lá você jogou também com muitos brasileiros.
Renato: Luis Fabiano, Daniel Alves, Adriano, Júlio Baptista, esses quatro brasileiros. Foram jogadores fantásticos, o Luis Fabiano teve uma parceria com o Kanouté maravilhosa. O Daniel e o Adriano foram para o Barcelona. Acabei voltando com o Luis Fabiano para o Brasil, até brinquei que o estava seguindo.

UOL Esporte: O Luis Fabiano sempre foi um cara polêmico em sua carreira. É um cara meio doido mesmo?
Renato: O Luis quando chegou lá já nos conhecíamos de jogar contra aqui no Brasil. Fora de campo é extraordinário, amigão, mas quando entra em campo quer ganhar. Ele muda, não é nada do que você vê fora. É totalmente diferente, briga com o zagueiro, xinga, gesticula, mas melhorou muito. No Sevilla a esposa estava grávida, então já acalmou. Lá falávamos para não tomar cartão bobo ou ser expulso, já tinha a fama dos cartões pelo São Paulo. Tinha hora que não dava, era super explosivo. O torcedor às vezes tem uma imagem. Eu falava muito com ele com relação a gesticulação, xingava em português. Ficava bravo porque era substituído.

UOL Esporte: Existe um fato triste na sua carreira?
Renato: Tem o do Antonio Puerta, um jogador espanhol que tinha acabado de ir para a seleção, com 22 anos, e acabou falecendo. Ele sofreu um desmaio contra o Getafe, em 27 de agosto de 2007. Já havia sofrido desmaios antes, foram feitos exames que não detectaram nada. E nesse jogo saiu do jogo, passou pelo banco de reservas andando, e sofreu a parada cardíaca. Não havia uma ambulância com aparelhos adequados, até o hospital teve mais paradas cardíacas. Ainda ficou alguns dias no hospital, mas não agüentou. Para o grupo se tratava de um cara extraordinário, a esposa estava grávida, então chocou todo mundo. Os seis meses depois ninguém acreditava sobre o que tinha ocorrido. Não estávamos tão bem no campeonato, até pelo fato emocional. 

UOL Esporte: E pessoal, para a sua carreira?
Renato: A perda da minha mãe, em 1999. Estava com 20 anos, ainda no Guarani. Ela foi quem sempre me incentivou com o meu pai, sofria depois de um derrame. Tudo o que ganhei sempre dedico a ela.

UOL Esporte: Quem foi o treinador que te descobriu no Guarani?
Renato: Lá foi o Giba, que acabou sendo o treinador que depois que me trouxe ao Santos, em uma troca com o Gustavo Nery. Agradeci a ele em vida por me trazer ao meu clube de coração.

UOL Esporte: Há uma história que muitos comentam sobre um valor que você abriu mão para ir a Europa. Como foi?
Renato: Foi em agradecimento ao Santos. Tinha contrato até o final de 2004, mas poderia sair antes com uma cláusula para clubes da Europa. Estava na Copa América e surgiu a possibilidade do Sevilla. Era o Luxemburgo o treinador, acabei saindo. Existia o contrato, mas disse que não estaria aqui. Me despedi do grupo, que não cobraria o contrato até dezembro por gratidão. Era algo que não achava justo, pois não estava no clube. Perdemos um, mas ganhei dois na frente. Fiz de coração e deixei para o Santos.

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