quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Retrospectiva 2010: Santos brilha em ano que tinha tudo para dar errado





Dois títulos em um ano, grandes craques revelados, gols, danças, recordes. No embalo de seus meninos, Peixe teve uma temporada inesquecível


O ano de 2010 foi histórico para o Santos. O clube revelou mais uma geração de jogadores brilhantes, com Neymar e Paulo Henrique Ganso como principais destaques, ousou ao repatriar Robinho, numa negociação que parecia impossível, conquistou dois títulos de expressão num mesmo ano, algo que não acontecia desde 1968. Voltou a ser o time da moda. Inesquecível, enfim.


E pensar que 2010 tinha tudo para dar errado para o Peixe. Após dez anos sob o comando de Marcelo Teixeira, o Santos terminou 2009 brigando para não ser rebaixado no Brasileirão e atolado em dívidas. Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro assumiu a presidência em dezembro e encontrou um clube em grave situação financeira: débito de R$ 177 milhões, sendo que cerca de R$ 75 milhões, relativos a empréstimos bancários, ou seja, com juros astronômicos.

Nos últimos anos, o Peixe havia conseguido se reerguer. Graças à geração de Robinho e Diego, que explodiu em 2002, o clube arrecadou cerca de R$ 170 milhões. Melhorou o Centro de Treinamento Rei Pelé, fez obras importantes na Vila Belmiro, construiu um outro CT apenas para as categorias de base. No entanto, o dinheiro acabou e o clube passou a depender de empréstimos.

No início de 2010, os salários estavam atrasados. O clube também não vinha fazendo os depósitos no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) dos jogadores. Com isso, havia a perspectiva de debandada: com Paulo Henrique Ganso e Neymar puxando a fila (após três meses seguidos de inadimplência, o funcionário pode requerer a rescisão). Era necessário levantar cerca de R$ 8 milhão para acertar esses pagamentos imediatamente.

- No início, eu cheguei a passar 12, 13, 14 horas no clube, madrugada adentro buscando solucionar os vários problemas. Foi muito difícil - afirmou Luis Alvaro, que chegou a comparar a situação financeira do Santos a Berlim, capital alemã, logo após a vitória dos aliados sobre Hitler, no fim da Segunda Guerra Mundial: terra arrasada.

O dirigente, que já trabalhou no Ministério da Fazenda, integrou a diretoria do Banespa e hoje é uma das maiores autoridades em avaliação imobiliária no País, reuniu um grupo de amigos santistas bem posicionados no mercado financeiro. Formou-se o Grupo Guia (Gestão Unificada de Inteligência e Apoio ao Santos), que aliviou a situação. Graças a atuação desses empresários, o Santos conseguiu alongar o perfil de sua dívida bancária, amenizando os juros. Além disso, obteve recursos para acertar todos os salários. Assim, houve uma certa tranquilidade para pensar na montagem do time.

'Robinho? Vocês estão loucos?'




contratação de Robinho é um episódio à parte. Num dia de janeiro, o gerente de marketing do Santos, Armênio Netto, entrou na sala de Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro e anunciou a idéia.
- Presidente, acho que podemos trazer o Robinho de volta.

O presidente santista riu e chamou Armênio Netto e louco. A ajuda do Grupo Guia servia parar tornar o clube minimamente administrável. Contratar jogadores de porte ainda não estava na pauta. Ou seja, como repatriar um atleta milionário sem dinheiro e, pior, endividado?

A receita já havia sido dada pelo Corinthians, que, graças a estratégias de marketing, repatriou Ronaldo. Primeiro, houve uma conversa com Robinho. Na reserva no Manchester City, ele queria voltar para jogar novamente e se preparar para a Copa do Mundo da África do Sul.


A Vila Belmiro seria o destino natural. Faltava a liberação do City. Armênio Netto e outro colaborador do Departamento de Marketing do Peixe, Eduardo Musa, além do vice-presidente Odílio Rodrigues Filho, viajaram para a Inglaterra a fim de obter o empréstimo. O contrato foi fechado rapidamente.

Para pagar o salário de Robinho, que chegou a R$ 1 milhão, o Santos funcionou como uma espécie de agência de publicidade do jogador. Quatro contratos foram fechados. O clube complementava com R$ 150 mil mensais.

A apresentação do craque, no dia 1º de fevereiro, foi apoteótica: ele chegou à Vila Belmiro de helicóptero, acompanhado por Pelé. O estádio teve lotação esgotada.

Gols e danças



Com Robinho, o Santos se encorpou. O time já vinha jogando muito bem, no embalo de Neymar, Ganso e André, com Arouca e Wesley correndo e marcando pelo time todo. O Rei das Pedaladas tornou um time muito bom em um esquadrão quase imbatível. Campeão Paulista, com 72 gols em 23 jogos, e da Copa do Brasil, com 39 gols em 11 partidas: um recorde.

Cada gol era comemorado com uma dancinha diferente. Neymar, Robinho e André eram os coreógrafos. O clima de descontração era tanto que até os mais velhos, como Marquinhos, e os mais timos, como Ganso, entravam na dança. Como o ataque santista era muito poderoso, a garotada tinha de usar a criatividade para inventar novas formas de comemorar. Teve homenagem para a Estátua da Liberdade, simulação de jogos de videogame, ordem unida (com os jogadores marchando como se estivessem num quartel)...


- Com o futebol que demonstramos no primeiro semestre, resgatamos a alegria do futebol brasileiro. O Santos voltou a ser protagonista e provocou uma revolução. Após um futebol burocrático, de toques de lado, na Copa do Mundo, a CBF decidiu apostar novamente nas origens do futebol brasileiro e convocou nada menos do que quatro dos nossos jogadores para participar do processo de renovação - comentou Luis Alvaro, que foi chamado para chefiar a delegação brasileira que enfrentou os Estados Unidos, em agosto, na primeira partida da Seleção sob o comando de Mano Menezes.

O chamado "Quarteto Santástico", formado por Ganso, Neymar, Robinho e André foi convocado.

Rebeldia do craque







Nem tudo foi festa, no entanto. Após um primeiro semestre perfeito, com imensa badalação (onde o time chegava, cenas de histeria), o sucesso parece ter subido à cabeça de Neymar. O garoto brilhante passou a perder a paciência com seus marcadores. Devolvia as pancadas com sua língua afiada. Alguns adversários acusaram o camisa 11 de ofendê-los.

Dorival Júnior defendia o seu pupilo com todos os argumentos possíveis. Dizia que havia um exagero, que Neymar era um bom menino. Até que ele mesmo acabou de tornando vítima da rebeldia do craque.

No dia 15 de setembro, durante jogo contra o Atlético-GO, na Vila Belmiro, o garoto mostrou suas garras: aos 39 minutos, quando o jogo estava 3 a 2 para o Peixe, ele recebeu na área, tentou um chapéu no marcador e foi derrubado: pênalti. Neymar não teve dúvidas: apanhou a bola e se preparou para a batida. Do banco, porém, veio a ordem. O prodígio vinha desperdiçando penalidades em sequência. Assim, Dorival decidiu que Marcel deveria cobrar a penalidade.

Neymar explodiu em xingamentos dirigidos ao chefe. Sobrou até para o zagueiro e capitão Edu Dracena, que tentou contê-lo. No vestiário, o garoto ainda discutiu asperamente com o auxiliar-técnico Ivan Izzo. O Santos, melhor time do Brasil no ano, cheio de craques badalados, estava em crise.

Dorival exigiu punição exemplar ao garoto, que foi chamado de “monstro” por René Simões, técnico do Atlético-GO que assistiu de camarote à confusão. A diretoria, num primeiro momento, atendeu ao treinador.


Neymar não jogou contra o Guarani, mas foi até o Brinco de Ouro se desculpar com os companheiros. Parecia que o caso estava encerrado. Neymar seria escalado no jogo seguinte, contra o Corinthians, e tudo ficaria bem. O problema é que, para Dorival, não estava tudo bem.


Apenas um jogo de gancho, para o treinador, não era suficiente. Por conta própria, ele decidiu manter o veto ao craque. Na véspera do clássico, dia 21 de setembro, anunciou que Neymar não jogaria, contrariando a direção. Horas depois foi demitido.

- Foi a decisão mais dura e difícil da minha vida - confessou Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro.


Fico de Neymar


Após a saída de Dorival, o Santos não conseguiu manter o embalo no segundo semestre, principalmente porque perdeu quase todos os seus principais jogadores.Wesley e André foram vendidos para Werder Bremen-ALE e Dinamo de Kiev-UCR, respectivamente.


Robinho teve de retornar ao Manchester City (que o negociou com o Milan). Já Paulo Henrique Ganso, durante confronto contra o Grêmio, no dia 25 de agosto, pelo Brasileirão, sofreu grave lesão no joelho esquerdo. Foi operado e só voltará a jogar em fevereiro.

O desmanche poderia ter sido ainda pior. Em agosto, o Chelsea chegou com tudo para tirar Neymar da Vila Belmiro. Os ingleses estavam dispostos até a depositar a multa de € 30 milhões (R$ 67,5 milhões). O Santos, porém, conseguiu convencer o garoto a permanecer, oferecendo um plano de carreira com direito a contratos de marketing, diversos cursos, tratamentos com fonoaudióloga, um assessor de imagem.

- Foi algo sem precedentes no futebol. Mostramos para os ingleses que não vai ser sempre que eles virão aqui para levar embora nossos principais jogadores. Eu tenho o sonho de ver o Neymar se tornar o melhor jogador do Mundo atuando pelo Santos - afirmou o presidente alvinegro.

Neymar conseguiu boas performances no Brasileirão, mas não foi o suficiente para a conquista da Tríplice Coroa. Com a vaga à Taça Libertadores 2011 garantida, graças à conquista da Copa do Brasil, o time tirou o pé no fim da temporada.

Ufa. Um ano eletrizante para o Alvinegro, com promessa de um 2011 melhor.

Globoesporte.com

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